Nem sempre sabemos o que esperar quando fazemos uma visita ao hospital, encontros e despedidas são frequentes nesse ambiente. Não raras são as vezes em que interagimos com uma pessoa num determinado momento e não voltamos mais a ter contato com ela. Sendo assim, cada encontro tem a chance de ser a única oportunidade de interação musical com aquele(a) paciente. Há uma rotatividade de pacientes em internação, e algumas pessoas em condições especiais de saúde que permanecem internadas por um período mais longo. Todas essas expectativas e surpresas causa-me alguns conflitos de sentimentos, pois, da mesma maneira que fico feliz em rever alguns pacientes a cada semana, pois inevitavelmente criamos vínculos de afeto e amizade, por outro lado me entristece pensar que essas pessoas ainda estão hospitalizadas, sendo que o melhor seria se não precisassem mais estar ali e sim tivessem recuperadas, com saúde e recebido alta hospitalar.
Uma paciente, internada há mais de uma semana estava deitada em seu leito quando passamos cantando e tocando pelo corredor. A filha da paciente filmou no celular nossa ação e mostrou a sua mãe, pois ela estava acamada, e dizia se sentir muito indisposta para levantar. Tocamos mais algumas músicas no corredor e a paciente pediu para a filha nos chamar. Fomos até ela e a paciente perguntou se poderíamos tocar uma música dentro do quarto, já que sentia dificuldade em levantar para nos ver no corredor. Então pedimos licença, entramos no quarto da paciente e lá cantamos a música Eu só quero um xodó (Luiz Gonzaga). Enquanto cantávamos, a paciente pediu para que a filha a ajudasse a levantar, pois ela queria dançar. Ficamos surpresos com a animação dela, muito diferente do momento de nossa chegada. Então entreguei a ela um chocalho e ela nos acompanhou tocando, cantando e dançando, ali mesmo sentada em sua cama. Carinhosamente chamamos esse momento de “o antes e o depois da música”, pois foram nítidas as reações de melhora no ânimo da paciente após a interação musical. Ao final da música a paciente perguntou quando voltaríamos e respondi a ela que na próxima semana estaríamos ali. Ela então lamentou: – Que pena, eu já terei ido embora.
A cada visita ao hospital é uma novidade, pois não sabemos quem iremos encontrar e em que situação de saúde estarão. Não é como no ambiente escolar, por exemplo, onde o(a) educador(a) se encontra semanalmente com uma turma de alunos, e que aula após aula o grupo é o mesmo, podendo assim planejar as atividades de acordo com as necessidades específicas desse grupo e visando objetivos pedagógicos específicos a curto, médio e longo prazo. No hospital sempre há a possibilidade de não encontrarmos mais aqueles pacientes que vimos nas semanas anteriores por motivos diversos, ou de alguém estar impossibilitado de realizar as atividade, ou de ter necessitado de um atendimento médico de emergência, ou infelizmente ter ido a óbito, etc. Dessa forma no que diz respeito ao planejamento das práticas musicais, lidar com o inesperado é uma constante no espaço hospitalar e é necessário estar disposto(a) a improvisar sempre que preciso, seja atendendo a um pedido de música que não esteja em seu repertório, de uma atividade adaptada as limitações de cada paciente, de ter a sensibilidade para entender e respeitar que determinada situação exige um momento de silêncio, ou poder tirar da manga uma canção que embale um momento especial, entre outras inúmeras possibilidades que surgirão e você deverá pensar rapidamente como agir diante delas.
Trabalhar com a música no espaço hospitalar é emocionante e surpreendente. Muitas vezes precisamos controlar nossas emoções e manter o equilíbrio diante de algumas situações nesse contexto. Durante as atividades, presenciamos diversas reações e depoimentos de pacientes, familiares e funcionários. Nos aproximamos dessas pessoas com a tentativa de conseguir através da música, minimizar o isolamento, promover a saúde cultural e, sobretudo, incentivar a interação social, contribuindo para que o hospital torne-se um ambiente mais humanizado. É gratificante vivenciar esses momentos e perceber os efeitos positivos que a música e a interação social são capazes de proporcionar às pessoas hospitalizadas. Sinto-me muito feliz em poder realizar esse trabalho e oportunizar às pessoas no ambiente hospitalar momentos de aprendizagem, descontração e alegria através da música.